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O desporto escolar e as aulas de Educação Física são, para a maior parte dos alunos, a única actividade física. As aulas nesse âmbito são, para a maior parte deles, o único momento em que contrariam o sentido de uma vida desregrada e sedentária. Como professor de Educação Física venho por este meio, sugerir/solicitar a divulgação de uma notícia que ameaça pôr fim a uma das actividades mais importantes das nossas escolas - o desporto escolar.
Passo a explicar: já saiu um projecto de despacho por parte do Ministério da Educação que visa passar o desporto escolar da componente lectiva para a não lectiva (ver ponto 5 do artigo 3º). Na prática, isto vai implicar o encerramento dos grupos/equipas das várias modalidades desportivas a breve prazo, como facilmente se depreende.
Informo que o desporto escolar envolve milhares de crianças de norte a sul. Essas crianças têm no desporto escolar uma oportunidade de prática desportiva organizada e empenham-se a fundo na consecução dos seus objectivos desportivos e de saúde. Informo também que, nos tempos que correm, o problema da obesidade, associado ao sedentarismo reinante, é um fantasma que assombra as escolas deste país.
O desporto escolar e as aulas de Educação Física são, para a maior parte dos alunos, a única actividade física. As aulas nesse âmbito são, para a maior parte deles, o único momento em que contrariam o sentido de uma vida desregrada e sedentária.
Posto isto, parece-me que esta proposta de intenções vai contribuir ainda mais para o agravamento da saúde física e mental dos nossos alunos. O desporto é um direito das crianças, é um direito de toda a gente e o Ministério da Educação prepara-se para "cortar as pernas" a quem se empenha e esforça por ter uma vida mais saudável.
Acrescento ainda que os encontros desportivos em competição distrital, regional e, por fim, nacional são um excelente meio de promover a sociabilidade entre alunos de diferentes escolas.
Também isso se perderá!
O desporto escolar procura, nos seus momentos de treino e competição (aos sábados, diga-se), incutir regras e o tão badalado espírito de fair-play, o respeito pelo adversário... Tudo isto são valores que, cada vez mais, são esquecidos pela nossa sociedade.
Terminando o desporto escolar, também isto se perderá cada vez mais.
António Dias Cunha | Mestre em Treino Desportivo, Faculdade de Desporto da Universidade do Porto
2011-01-24
in www.educare.pt
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Educação e Desporto Escolar: quebra de compromisso e miopia estratégica
Vários órgãos de comunicação social publicaram recentemente a intenção do governo, através do ministério da educação, que visa a transferência dos horários do desporto escolar da componente lectiva para a não lectiva. Esta medida cirúrgica, poderá ter o condão de eliminar dois “alvos” com o mesmo disparo: banir o desporto do sistema educativo e eliminar milhares de horários lectivos, cuja factura social será mais um duro golpe.
A relevância da prática desportiva é referida insistentemente pelos diversos organismos governamentais e não governamentais com responsabilidade na análise dos contextos sociais e apresentação de recomendações. O Governo da República Portuguesa, submeteu a sufrágio no ano de 2009 um programa de governo, onde estão expressas as linhas orientadoras e prioridades do governo para o ciclo quadrienal (2009-2013).
Nessas linhas orientadoras e prioridades, foi dado DESTAQUE PARTICULAR ao desporto escolar, nomeadamente no capítulo II e III do mencionado programa de governo, a saber: “capítulo II, ponto 1. Mais e melhor educação (…) na alínea j) Aprofundar o desenvolvimento do desporto escolar e promover a sua generalização e valorização;” “capítulo III, políticas sócias: A escola, grande promotora de Saúde. (…) A aposta do PS para a próxima legislatura é desenvolver um projecto que assente no diagnóstico das necessidades da população escolar e, (…) com atenção particular ao desenvolvimento do desporto escolar (…)”
Concretizando-se a ideia peregrina da transferência dos horários do desporto escolar da componente lectiva para a não lectiva, podemos concluir que, se for confirmada a intenção, existirá uma quebra de compromisso do governo, que num sector chave para o desenvolvimento do país, a educação, consegue propor a eliminação de uma actividade fulcral para a manutenção do equilíbrio físico e mental dos jovens.
Esta decisão poderá (terá) manifestar um estado doentio de alguns decisores, a denominada miopia estratégica. Mas não são estes os únicos responsáveis, não devemos desresponsabilizar as famílias relativamente ao papel da actividade física e desportiva no quotidiano dos jovens. Quando a aposta na escola deveria estar focada em ensinar mais sobre a importância do exercício físico e desportivo na saúde e qualidade de vida, fazemos exactamente o contrário daquilo que são as orientações e boas práticas.
A prevenção da inactividade física e da obesidade tem de ser uma prioridade. A Organização Mundial de Saúde (OMS) aponta a obesidade como um dos mais sérios desafios de saúde pública do século XXI. É um problema global, contudo, é admitido que em Portugal temos um terço das crianças obesas e metade da população com peso a mais. Em suma, esta intenção do governo não pode ter outra classificação: miopia estratégica. É um exercício complexo tentar perceber a (in)sensatez de uma eventual decisão política que pode afectar de forma transversal a população, acresce o facto de todas as recomendações de reputados organismos internacionais, como por exemplo as nações unidas (ONU), considerarem o desporto, e particularmente no sistema educativo, um elemento fundamental, ao ponto de o ter integrado nos “Objectivos de Desenvolvimento para o Milénio - Millenium Development Goals (MDG)”.
O comité intergovernamental da UNESCO responsável pela educação física e desporto (CI-GEPS), na última reunião realizada em Paris no mês de Julho de 2010, recomenda a intervenção e implementação de medidas específicas aos governos de todos os países, focando entre outros, os seguintes aspectos:
Educação física e desporto promove a saúde e o bom estar, é um elemento fundamental na educação, enriquece a qualidade de vida e aumenta a produtividade.
É unânime a relevância da educação e o papel que ela desempenhar no desenvolvimento do país. Contudo, a implementação dos programas e medidas estratégicas associadas para este ou outro sector da sociedade, têm de ser acompanhadas, monitorizadas e avaliadas efectivamente, para se assegurar uma correcta implementação e monitorizar os resultados.
Não posso estar seguro de que a decisão do governo de transferência dos horários do desporto escolar da componente lectiva para a não lectiva, tenha considerado estes aspectos, não pode ter sido uma decisão ponderada, reflectida. Não podemos insistir na “destruição” por decreto de programas e projectos de crucial relevância para o país, através de uma assinatura, apesar da competência que possa ter para tal. A irresponsabilidade tem um preço alto, não podemos cruzar os braços perante tamanha falta de bom senso e estratégia.
Recentemente um investigador americano (Eric Hanushek) referia alguns dados interessantíssimos sobre o impacto da educação no crescimento económico de um país. Referia Eric Hanushek que, se todos os alunos Portugueses chegassem ao nível da Finlândia nos resultados do PISA (programa internacional de avaliação dos estudantes, coordenado pela OCDE), o valor do PIB aumentaria em 2,9 biliões de dólares.
Sem dúvida alguma, o factor mais importante no desenvolvimento e crescimento económico é a educação, custa a acreditar que sabendo isto, não seja possível colocar a prioridade, conhecimento, competência neste sector, assegurando condições políticas para que os programas nesta área tenham estabilidade, sejam de longo termo, sejam acompanhados, sejam monitorizados, sejam avaliados.
Pedro Dias
Correio do Minho – 26-01-11
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